Circula na internet nos últimos dias a foto de Osman Sağırlı comoveu o mundo. A pequena criança Síria vê a câmera e acha que se trata de uma arma. Sua reação é surpreendente: ela ergue as mãos em rendição.
Enquanto todos ficaram chocados com tal imagem, é difícil não pensar no paralelo que pode ser feito em comparação com as formas de disciplina que aplicamos às nossas crianças aqui mesmo.
O instinto mais forte do homem (e dos animais) e, por causa dele, agimos das formas mais surpreendentes. Foi ele que moveu essa criança a erguer os braços. Desde pequena ela está na guerra, se não nasceu durante o conflito, que já dura 4 anos. Nesse tempo, ela viu e soube de muita gente morta por lutar contra a prisão, por demonstrar algum movimento brusco e tantos outros motivos. Com essa experiência, ela desenvolveu uma estratégia de sobrevivência que incluía não dar motivo a ninguém para acabar com sua vida. Ao ver a câmera apontada para si, ela fez o que seu instinto mandou: levantou os braços se entregando.
Por que podemos fazer um paralelo com a educação dada a nossos filhos? Porque esse processo é o mesmo para todas as crianças, independente do grau de violência aplicada em sua disciplina. Uma criança que apanha em casa passa por um processo psicológico e fisiológico semelhante ao da pequena Hudea. Alguns pais acreditam, até mesmo pela educação que receberam, que o mais importante é a criança obedecer aos pais, independente do que seja necessário para isso.
Entretanto, quando refletimos um pouco sobre o assunto, não é difícil entender. Quando se bate em uma criança, aquele mesmo instinto de sobrevivência entra em ação. Aliás, o que acontece com seu corpo se você perceber que alguém bem maior que você vai partir para cima em uma briga? Imediatamente há uma descarga de adrenalina que coloca a pessoa pronta para uma de duas possibilidades: fuga ou luta. No caso da criança, geralmente, é a fuga porque ela é muito menor que os adultos. Essa fuga, nem sempre significa correr mas, minimizar a situação, ou seja, a criança para imediatamente o que está fazendo e se encolhe para se proteger ou, como no caso da foto, se entrega.
Com crianças de personalidade mais desafiadora, em alguns casos, a escolha é a luta. Lembre-se que essa escolha é automática, instintiva e não consciente. É como quando você, sem pensar, pula para o lado quando ouve um cachorro latir e se vira automaticamente para ele, com o objetivo de ver se ele está em condições de lhe atacar. A criança não está desafiando por vontade própria. Só a reação dela é diferente. Esses são os casos das crianças que se debatem, gritam, brigam com os adultos. Qual a reação da maioria das pessoas? Aumentar o nível de violência. Isso porque, se eu o aumentar suficientemente, a fuga vai ser a única escolha a ser tomada e a criança vai parar.
Mas, como pais, parem e pensem. Será que eu quero mesmo submeter meu filho a uma escolha de vida ou morte? Qual o efeito desses hormônios do estresse em seu organismo? O que estou ensinando?
Essa reflexão, geralmente nos mostra que eu estou dando uma lição um tanto controversa para a criança. Ela aprende que, enquanto for fraca, deve submeter-se aos mais fortes para sobreviver mas, que, quando estiver em posição de poder, pode agir fisicamente sobre os outros. Por isso, a violência física (palmadas e chinelada, por exemplo) e a violência psicológica (gritos e xingamentos) têm sido fortemente associados ao bullying em escolas ou com irmãos mais novos. Quando essas crianças que em casa devem ficar quietas para “sobreviver”, acham crianças menores e mais fracas, elas repetem o comportamento dos pais para se autoafirmarem.
Outro argumento bastante usado por pais que usam esse tipo de disciplina é que, se não fizerem isso, em breve estarão apanhando dos filhos. Mas, isso faz sentido? Qualquer pedagogo(a) ou psicólogo(a) vai poder confirmar que as crianças aprendem prioritariamente pelo exemplo. Se não houver violência em sua casa, o que lhe faz pensar que a criança crescerá para se tornar um adulto violento?
Repense sua forma de educar constantemente. O seu pensamento prioritário deve ser: como desejo que meu filho cresça? Se a resposta é pacífico e respeitoso, seja pacífico e respeitoso com ele. Se a disciplina de punição não está dando certo, não aumente o volume dos gritos ou a quantidade de palmadas. Mude de estratégia porque quanto mais você fizer, mais vai precisará fazer e esse círculo vicioso só vai gerar cada vez mais conflito em sua casa, em seu lar.
Se o mundo está como está, a situação foi criada por uma geração que apanhou e ouviu muito gritos e não pelas crianças de agora. Hoje, as pessoas estão insensíveis e têm muita dificuldade de entenderem os que os outros sentem ou que os outros têm sentimentos. Se quisermos um mundo onde todos se respeitem, precisamos começar urgentemente a respeitar as crianças. Todas elas.